quinta-feira, 1 de agosto de 2013

A morte de um paraplégico despejado pelo Estado afronta a dignidade

O respeito à propriedade privada é um dos pontos elementares do Estado de Direito. O esbulho possessório fere a espinha dorsal de uma sociedade estabelecida sobre conceitos de direito à vida, a liberdade e justiça.

José Irineu Toledo, de 80 anos, um idoso e paraplégico, morreu um dia antes de sua família ser despejada por causa do porto de Eike Batista

A força do Estado, em tese, deveria assegurar o direito à posse, à vida e a liberdade. Estaria cumprindo sua missão original, já que ele nasce para servir a sociedade.

Na Região do Açu, zona rural de São João da Barra, no Norte do Estado do Rio de Janeiro, a força do grande Leviatã, denominação de Thomas Hobbes, está sendo utilizada para despejar centenas de pequenos produtores rurais a pretexto de instalação de um Distrito Industrial da Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado (Codin). Idosos, crianças, mulheres estão sendo retirados de suas respectivas propriedade sem o menor critério.

A situação nos últimos dias ganhou contornos ainda mais dramáticos. Um produtor rural idoso, paraplégico, morreu um dia antes de sua família ser expulsa da própria residência por oficiais de justiça munidos de mandatos de imissão de posse em nome da Codin.

José Irineu Toledo, de 86 anos, era paraplégico e sua saúde se deteriorou ainda mais em função da tensão que viveu nos últimos dias. Suportou a agonia nos últimos três anos, quando começou o festival de desapropriações. O corpo do idoso foi velado nesta quinta-feira, dia 01, no que foi a propriedade de sua família, no distrito de Água Preta. É uma demonstração explícita de que a força do Estado, neste caso, não está servindo a sociedade.

É uma situação que afronta os princípios da dignidade humana, o Estatuto do Idoso, a Constituição Federal e o bom senso.

O porto do Açu é um empreendimento do grupo do empresário Eike Batista, uma figura, cujos negócios, estão à beira de um precipício. Num país sério ele estaria enquadrado por gestão temerária, já que usou e abusou dos recursos liberados pelo BNDES num negócio condenado ao fracasso. O Estado é o único investidor que ainda acredita nele a ponto de atropelar o ordenamento jurídico.

Lembro aqui os conceitos de John Locke seu livro “Ensaio acerca do Entendimento Humano”. Locke foi um dos ideólogos que contribuiu para derrubada do absolutismo na Inglaterra, que originou a monarquia parlamentarista que sobrevive nos dias de hoje.

Na teoria sobre a origem e a natureza do conhecimento, o filósofo dizia que os homens, ao nascer, tinham direitos naturais à vida, à liberdade e à propriedade. Para garantir esses direitos naturais, os homens criaram governos.

Mas se os governos não respeitassem a vida, a liberdade e a propriedade, o povo tinha o direito de se revoltar contra eles. As pessoas poderiam contestar um governo injusto e não seriam obrigadas a aceitar suas decisões. Ignácio Barbosa, meu distinto avô, costumava ressalvar que para “quem sabe ler, um pingo é letra”. A julgar pelos conceitos de John Locke, toda e qualquer revolta no Açu se justificaria nas ações ilegais de um Estado que atropela o direito.

FONTE: www.robertobarbosa.com